Na audiência de Justiça Terapêutica deste mês (06/07), realizada no Fórum de São José dos Campos, o projeto registrou novamente alto índice de aceitação por autores de delitos de menor potencial ofensivo ligados ao consumo abusivo de álcool ou drogas.
Dos que participaram da audiência nessa segunda-feira, 56,1% aderiram à proposta de tratamento para tentar se livrar da dependência química e, com isso, deixar de responder a processo criminal.
O resultado do projeto tem evoluído com a integração entre órgãos de segurança, saúde, justiça, universidades e recursos comunitários. Também devido às ferramentas de Justiça Restaurativa empregadas, pelas quais os usuários e familiares têm oportunidade de se expressar, partilhar histórias de vida e de refletir com o trabalho das equipes multidisciplinares que participam da audiência. Na área criminal, o fluxo do projeto inicia-se na Delegacia de Polícia, em que usuários são orientados e assinam um termo em que se comprometem a comparecer com seu familiar aos plantões do CAPS-AD (Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas).
Neste local, em parceria com universidades de psicologia, busca-se reflexão, avaliação e, se necessário, o melhor tratamento cabível para aquele usuário. Paralelamente, o boletim de ocorrência é remetido ao Fórum e os usuários e familiares são intimados a comparecer na Audiência de Justiça Terapêutica, em que incialmente são abordados aspectos jurídicos e de saúde em uma palestra motivacional.
Professora da Faculdade de Psicologia explica o papel da Universidade no Projeto 2 Após a palestra, somente permanecem no salão os familiares, ocasião em que uma equipe aborda a co-dependência e o papel da família no enfrentamento da dependência química.
Já os usuários são divididos em grupos e encaminhados a diversas salas, onde são realizados os chamados “processos circulares”, em que são empregadas diversas técnicas de reflexão próprias da Justiça Restaurativa, da Mediação de Conflitos e da Saúde (escuta ativa, perguntas restaurativas, intervenção breve etc). O círculo de cada sala é conduzido por uma pessoa capacitada em Justiça Restaurativa, que recebe apoio de um profissional da saúde e de um da área do direito. Ao final dos círculos, é proposto ao autor do delito o seu tratamento, em vez do cumprimento de uma prestação de serviços à comunidade.
Caso aceite a proposta, é providenciada a sua inserção em um "programa de tratamento" (para dependentes químicos) ou em um "programa de prevenção" (para usuários iniciais ou abusivos) junto a equipamentos de saúde e de inserção social, a entidades de autoajuda e/ou a faculdades de psicologia. Com o cumprimento do programa, o processo criminal é arquivado. Já em caso de descumprimento, ele perde o benefício e se tornar réu em processo criminal.
Processo Circular da Justiça Restaurativa garante participação, troca de experiências de vida e conexão entre a equipe técnica e os usuários Na audiência desta semana, dos 41 réus presentes, 23 aceitaram o programa de tratamento, o que representa 56,1 % de aceitação.
Todos os 82 usuários e familiares presentes na audiência se comprometeram a comparecer na Clínica da Faculdade de Psicologia da Universidade UNIP para avaliação de suporte psicoterapêutico. Mas mesmo para os dependentes que necessitavam de tratamento e não aceitaram o programa, posteriormente são desenvolvidas ações de sensibilização durante a sua prestação de serviço à comunidade. Os familiares 3 também foram sensibilizados e encaminhados a serviços de apoio a familiares. Projeto Comarca Terapêutica Desde o seu início, em junho de 2012, o projeto atendeu 486 familiares e 991 usuários de drogas envolvidos processos judiciais que tramitam perante o Juizado Especial Criminal da comarca. Do total de usuários, 571 foram encaminhados para tratamento, por reflexão e escolha própria. Porém, visando a sua ampliação na comarca, busca-se a criação do 1º Centro de Justiça Terapêutica do Estado de SP, aplicando-se o projeto a todas as demais áreas (Vara Criminal, Vara de Violência Doméstica, Vara da Família, Vara da Infância etc). Para tanto, a Procuradoria Geral de Justiça do MPSP e a Presidência do TJSP realizaram reuniões com diversos órgãos na busca de apoio para a criação de um Setor Técnico Judicial – Álcool e Drogas, cujos psicólogos e assistentes sociais dariam apoio e suporte ao projeto.
Para o Promotor de Justiça Fábio Rodrigues Franco Lima e o Juiz Flávio Fenoglio Guimarães, coordenadores do projeto, “quando se fala da problemática justiça vs drogas, somente nos vem a mente a discussão da descriminalização e da internação compulsória. Mas diversas outras ferramentas conjuntas podem ser construídas entre justiça, saúde, segurança, universidades e comunidade”.
Quanto a atual discussão da política de drogas, esclarecem que “a descriminalização por si só, não faria milagres nem em Portugal, cujo maior êxito foi ampliar, integrar e estruturar seus serviços e sua política de atenção às drogas. Com a descriminalização, não teríamos nem Justiça nem Saúde, já que a quase totalidade de municípios sequer conta com serviços estruturados para tratamento. Precisamos urgentemente de projetos que integrem os diversos órgãos e de investimento e organização das Rede de Atenção à Saúde Mental no país”.