Ana Paula Siqueira, Presidente da Associação SOS Bullying, mestre e doutoranda pela PUC/SP, professora universitária e pesquisadora em cyberbullying e violência digital
Ana Paula Siqueira, Presidente da Associação SOS Bullying | Foto: Divulgação |
O bullying está presente na vida de praticamente todas as crianças e jovens do Brasil. Vítimas, agressores ou pessoas que presenciaram casos de perseguição, todos já vivenciaram pelo menos um episódio de bullying e conhecem o sofrimento gerado por ele.
Apesar de não estar limitado ao ambiente escolar, é nas instituições de ensino e nos grupos de redes sociais formados por alunos e pais que o bullying mais se manifesta.
Mas, mesmo tão grave e tão presente nas escolas, a maior parte dos profissionais da educação ainda não recebe formação e informação para lidar com os casos quando eles ocorrem, fato que afronta diretamente a Lei do Bullying (13.185/15), artigo 4, inciso II (capacitar docentes e equipes pedagógicas para a implementação das ações de discussão, prevenção, orientação e solução do problema).
Parece mais pertinente (e cômodo) negligenciar o atendimento e deixar à vítima à mercê de seus algozes, lidando com o próprio sofrimento, do que dar a atenção necessária e solucionar o problema.
Como exemplo, cito três casos simples, todos ocorridos esse ano.
Em Belo Horizonte (MG), uma mãe fez contato com a direção da escola diversas vezes para denunciar o bullying sofrido pela filha. O ponto de partida das agressões foi a forma física da vítima. A resposta da escola foi que a menina apresenta dificuldade de interação com os colegas.
Na Bahia, em Teixeira de Freitas, um menino sofria bullying por racismo. O pai teve que apelar à polícia, após procurar a diretora e ouvir que o melhor era transferir o filho de escola.
Em Ribeirão Preto (SP), um pai relatou para a diretora da escola que o filho aparecia com escoriações e hematomas há mais de um ano. Ao ouvir da diretora que ele deveria resolver o problema diretamente com a família do agressor. Ele se enfureceu, virou uma mesa e acabou detido pela polícia.
Esses três casos mostram o completo despreparo dos profissionais de educação para mediar casos de bullying.
O Brasil tem legislações preventivas, como a Lei do Bullying, que estabelece medidas a serem adotadas nas escolas, como o desenvolvimento da Cultura da Paz, e punitivas, como a Lei 14.811/24, que inclui o bullying no Código Penal e prevê até quatro anos de prisão.
A Lei 13.185 é clara ao definir as ações que devem obrigatoriamente ser implementadas por escolas e gestores para prevenir, monitorar e atender casos de bullying.
Escolas e gestores, atenção: a legislação sobre bullying exige mais do que simples palestras anuais ou reuniões esporádicas. É mandatório que as instituições desenvolvam e mantenham um plano de combate ao bullying, rigorosamente documentado e ativamente implementado.
A Justiça brasileira já está responsabilizando civil e criminalmente as instituições de ensino que falham em proteger seus alunos. Condenações cíveis e pesadas indenizações são realidades que podem afetar severamente as escolas.
A curto prazo, o bullying deteriora o ambiente educacional, transformando espaços de aprendizado em zonas de risco. É preciso investir agora na capacitação de educadores para garantir um ambiente seguro e inclusivo para todos.
A falta de ação não é apenas negligente; é financeiramente e moralmente custosa para a instituição e deixa cicatrizes psicológicas nas vítimas para o resto de suas vidas.