Por Rodrigo Merli Antunes
Imagine a seguinte situação: Um determinado marido, suspeitando da fidelidade de sua esposa, contrata um detetive particular para seguir seus passos. Decorridos 15 dias, o investigador presta contas ao esposo: “A situação está grave. Filmei sua esposa entrando em um motel com um rapaz bem apessoado, bem como os segui até um dos quartos ali existentes, local onde verifiquei, pelo buraco da fechadura, que ambos tiravam suas roupas”. Absolutamente cético, o marido retruca: “Você é muito apressado! Existem crimes que ocorrem na igreja e atos benevolentes que se passam em um motel.
Além disso, há problemas que se dão em uma cozinha, mas há atos muito honrosos que ocorrem dentro de um quarto. Para mim, isso não significa nada. O quê mais você viu?” Como resposta, o detetive devolve: “Daí pra frente, eu não vi absolutamente nada. Uma peça de roupa íntima tapou minha visão, encobrindo o buraco da fechadura por onde eu os observava”. “Pois é”, diz o marido, “é esta dúvida que me mata!”. Parece ridículo, não? Mas, por incrível que pareça, raciocínio semelhante foi adotado recentemente em um Tribunal de Justiça do sul do país, local onde dois assaltantes foram absolvidos por “insuficiência” de provas.
Da análise da decisão, percebe-se que a prisão em flagrante, a apreensão da coisa subtraída com os agentes, bem como o reconhecimento feito pela vítima e por uma testemunha presencial, não significou absolutamente nada. O relevante foi que ambos os réus negaram o crime e que os policiais responsáveis pela detenção, de acordo com os acusados, eram seus inimigos capitais, estando, portanto, a persegui-los injustamente. Simplesmente bizarro, não é mesmo? Creio que o marido traído aí de cima deva trabalhar no tal tribunal. Pelo visto, ele está contaminando todo o ambiente com seu “lógico” raciocínio. Infelizmente, este é o retrato de nosso Direito Penal moderno. Na cara dura, estão a promover o enterro de provas vivas e a providenciar o sepultamento da própria justiça.
A bandidolatria alcançou patamares inacreditáveis, tornando-se endêmica e epidêmica em muitos locais. Só mesmo por Deus para continuar trabalhando com isso tudo! Aliás, quando me deparo com decisões como esta, minha vontade é uma só: correr para o banheiro e vomitar sem parar!
Sobre o Autor:
Rodrigo Merli Antunes é Promotor de Justiça do Tribunal do Júri de Guarulhos; Pós graduado em Direito Processual Penal e Autor de artigos e obras jurídicas.