Com certeza, esse é um tema muito delicado e difícil de ser falado, em qualquer época da nossa vida, e com qualquer pessoa.
Se é difícil para nós, adultos, imagine para as crianças. Como toda nova experiência, pode ser bastante confuso e assustador para as crianças, ainda mais em caso de morte por acidente. Quando acontece, seja ela com o bichinho de estimação ou com um ente querido, as crianças precisam de todo nosso apoio e, principalmente, de nossa sinceridade, para que haja confiança.
Antes de começar a explicar, temos que ter claro em nossa mente o que é a morte para nós mesmos, e pensar em que realmente acreditamos, porque só assim poderemos responder aos questionamentos delas, que vão ser muitos. Se quiser, vale explicar também que nem todos pensam exatamente como o papai e a mamãe, e dar versões de outras religiões.
Devemos entender também que o luto é um processo, e não um evento. Isso quer dizer que demanda tempo, e cada criança precisará de um tempo diferente para superar sua perda. Pressionar a criança a voltar a ter “vida normal”, sem dar o tempo necessário, implicará em outros problemas ou reações negativas.
Muitos pais têm dúvida de quando começar a falar sobre o assunto ou então preferem nem falar. Deixar de falar não é a melhor solução, pois a morte é algo que faz parte da vida de todos nós. Ela está nas plantas, nos bichinhos, nos amigos e familiares. A melhor época para falar sobre o assunto é quando a situação acontecer, e essa situação pode ser a morte de alguém querido ou o questionamento da criança sobre o porquê a florzinha do vaso morreu. A criança não irá se beneficiar de “não tocar no assunto” ou “tirar isso da cabeça”. Nunca fuja do assunto quando a criança quiser conversar sobre o tema.
Entre 5 a 7 anos, a criança começa a entender melhor como relacionar sua vida com o mundo. Então, automaticamente, ela conseguirá relacionar a morte com algo que ela perdeu, como um brinquedo, por exemplo.
A morte faz parte do ciclo da vida. Uma ótima maneira de preparar seu filho de maneira simples é ensiná-lo desde pequeno com exemplos práticos. Plante uma semente e vá mostrando como ela nasce, cresce e morre. Lembra daquele feijãozinho plantado no algodão que todos nós fizemos na escola? Pode ser um ótimo aliado neste momento. O mais importante desta experiência é mostrar que esse processo é natural e que independe de ele ter cuidado direitinho da planta.
Há três itens em relação à morte que a criança precisa entender:
- Tudo que é vivo vai morrer um dia;
- Quando morre não volta mais;
- Depois que morre, o morto não sente dor, não corre, não sente medo, não dorme, não pensa, não age mais.
Crianças até 3 anos não conseguem perceber claramente isso, mas entendem que não brincarão mais com a tia, ou que o avô não a buscará mais na escola. As mais velhas percebem que a morte é algo natural, mas precisarão de explicações concretas para entendê-la. Só a partir de 12 anos é que a criança consegue entender completamente todo o processo.
Nunca associe morte com sono! Para contar à criança que alguém morreu, o melhor é não mentir e nem contar historinhas do tipo: “ele dormiu para sempre”, “descansou”, ou “fez uma longa viagem”. As crianças entendem as frases exatamente como são ditas, e isso pode causar confusão na cabecinha delas. Podem achar que a vovó que morreu está apenas dormindo e vai acordar a qualquer momento e chegar em casa, ou que todo mundo que viaja nunca mais volta, ou quando o papai chegar e disser que está cansado, ela vai achar que ele vai dormir e morrer. Aliás, a própria criança pode começar a ter medo de dormir e não acordar mais. Se disser que “fulano virou uma estrelinha”, a criança vai acreditar e, quando olhar para o céu, irá achar que todas as estrelas são pessoas mortas.
Se um ente querido estiver muito doente a criança deve saber o que está acontecendo. Por mais nova que ela seja, irá perceber o clima da casa. Explique que a pessoa está doente e que é grave. Se caso a pessoa morrer, nunca chegue para a criança contando o que aconteceu de repente. Comece a conversa relembrando do ciclo da vida da plantinha, daquele feijãozinho que vocês plantaram. Encare como uma discussão em aberto, e não como um discurso! Dê espaço para a criança tirar as suas dúvidas. Comece com fatos básicos, descubra o que a criança sabe e pensa, para decidir o quanto mais de informação ela tolera. Nem todas as crianças suportam muitos detalhes. Mais uma vez: a criança precisa de apoio e sinceridade.
Nunca esconda seus sentimentos. Não queira passar a imagem de que está tudo bem. Ao contrário, exponha suas emoções, pode chorar e dizer que será difícil para todos da família. Isso fará a criança perceber que o que ela está sentindo é normal. Demonstre que, como a criança, você também sente saudades e está sofrendo, e deixe que ela fale sobre os seus sentimentos. Garanta que ela não está sozinha, e sempre haverá alguém para cuidar dela, principalmente se a perda for de um dos pais. E tenha paciência, pois é possível que ela pergunte as mesmas coisas várias vezes.
É natural que a criança apresente mudanças de comportamento após a notícia da morte de alguém com quem convive. Além do choro e da raiva, pode começar a ir mal na escola, ficar hiperativo ou fazer xixi na cama. Considere ajuda da escola e até de um psicólogo. É importante que a criança sinta que tem apoio e atenção também dos colegas e professores.
Outra dúvida comum é se a criança deve ir a velórios ou enterros. Não se deve forçar, mas a criança pode se beneficiar de participar junto com os adultos. Os rituais servem para que todos vivenciem melhor a despedida, inclusive os pequenos. Os especialistas concordam que velórios e enterros não traumatizam as crianças. Explique muito bem antes como é o velório ou o enterro, e pergunte se ela quer ir. A criança precisa saber antes que será triste, e que muitas pessoas estarão chorando. Não decida pela criança que ela deve ficar de fora, mas também não a obrigue a ir se ela não quiser, e não deixe que se sinta culpada se não for.
O mais importante de tudo é sempre agir com honestidade, com a verdade, para que seu filho possa sempre confiar em você. Se não souber responder a alguma pergunta, não tem nenhum problema em dizer “não sei”. Buscar as respostas junto com seu filho poderá uni-los ainda mais. Quando procurar ajuda profissional? Em casos de raiva ou hostilidade excessivas, ou quando a criança não expressa nenhum luto, ou em casos de depressão ou ansiedade que interferem nas atividades diárias, durando semanas ou meses.
Por Dr. Carlo Crivellaro, Pediatra com Título de Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria;