Colaboradores - Fabiano de Abreu

MPF ordena condenação do deputado federal cassado Eduardo Cunha

7 de Março de 2017

O Ministério Público Federal no Paraná pediu ao juiz federal Sergio Moro a condenação do deputado federal cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas pela manutenção de depósitos não declarados no exterior" por 14 vezes.

Além disso, os procuradores querem que o político seja condenado "a reparação dos danos materiais e morais causados por suas condutas, no valor de US$ 77,5 milhões (R$ 232 milhões), valor total do prejuízo do negócio apurado pela Petrobras".

O MPF quer, ainda, que Cunha pague multa de 5.400 salários-mínimos de 2011 (R$ 2,9 milhões, no total), época em que o crime atribuído ao político foi cometido.

O pedido está nas alegações finais apresentadas pelo MPF em processo derivado da operação Lava Jato em que Cunha é acusado de receber US$ 1,5 milhão em propina paga na compra pela Petrobras de campos de petróleo em Benin, na África, e de ocultar o dinheiro em contas bancárias na Suíça.

Apenas o crime de corrupção passiva pode render de dois a 12 anos de prisão. No caso de Cunha, o MPF pede ainda extensão da pena em um terço, conforme prevê o artigo 317 do Código Penal.

 

O QUE DIZ O MPF

O documento de 112 páginas, assinado por dez integrantes da força-tarefa da operação Lava Jato no MPF e anexado no fim da tarde de segunda-feira (6) ao processo, diz que Cunha se utilizou de um "engenhoso e sofisticado esquema" para receber e ocultar a propina.

Por conta disso, "o acusado deve ser condenado pela prática dos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, todos em concurso material, somando-se as penas legalmente cominadas em razão da autonomia de desígnios entre cada um destes delitos."

"As condutas de corrupção, lavagem de dinheiro e manutenção de depósitos não declarados no exterior são completamente autônomas entre si. Por essas razões, não há que se falar em consunção entre crimes, devendo ser somadas as penas em concurso", argumentam os procuradores.

"Restou plenamente comprovada a prática, por parte do réu, do crime de corrupção passiva pelo recebimento de vantagem indevida em razão da função de deputado federal exercida na época dos fatos, bem como a prática de ato de ofício que infringiu os deveres funcionais de parlamentar", diz o documento.

Também "não há qualquer dúvida de que [o deputado cassado] tinha total controle dos 'trusts' e de suas respectivas contas bancárias, sendo efetivamente o 'beneficiário econômico' destas contas e consequentemente dos valores nelas depositadas. [Ele] Tinha plena e total disponibilidade destes depósitos que nunca foram declarados as autoridades brasileiras", prossegue o texto.

"É elevada a culpabilidade de Eduardo Cunha em razão do seu elevado conhecimento do injusto, na medida em que, como economista formado e político profissional, sabia muito bem do caráter ilícito dos atos que praticou, notadamente constituir contas secretas no exterior para receber propinas. Além disso, é inegável que poderia agir de modo diverso, sobretudo em razão dos altos cargos e responsabilidades de sua alçada", argumenta o MPF.

"Ademais, em toda a fase de investigação de seus crimes, Cunha adotou um agir antiético, mendaz e até mesmo afrontoso às instituições públicas que buscam responsabilizá-lo por seus atos. Com efeito, durante toda a fase de investigação preliminar [ele] praticou diversos atos que buscaram atravancar as investigações, com a utilização de artifícios regimentais para atrasar seu processo de cassação, a demissão de funcionário da Câmara dos Deputados que produziu provas em seu desfavor e até mesmo ameaças e intimidação de testemunhas, colaboradores e advogados que poderiam prejudicá-lo", escrevem os procuradores da força-tarefa da Lava Jato.

"Tal conduta permaneceu, inclusive, no curso do presente processo, tendo em vista a posição intimidadora do acusado na formulação de quesitos às testemunhas ouvidas no presente processo, inclusive do presidente Michel Temer, com perguntas potencialmente incriminadoras alheias ao objeto da ação penal e com o fim específico de causar constrangimento e servir como uma espécie de 'ameaça' aos depoentes", afirma a acusação.

 

 

"NÍVEL EXTREMO" DE DISSIMULAÇÃO

Para o MPF, Eduardo Cunha tinha "efetiva administração e total disposição dos valores que transitavam nas contas [na Suíça], os quais nunca saíram de sua esfera de propriedade, a despeito de sua alegação de que o responsável por essa movimentação era o 'trust' da conta e que a propriedade dos valores havia sido transferida sem ônus, a exemplo de uma doação."

Os procuradores anotam no documento apresentado a Sergio Moro que os "trusts" que alegam pertencer a Cunha não foram "facilmente identificados", mas "descobertos somente porque houve uma meticulosa investigação por parte das autoridades suíças, após alertadas pela investigação iniciada no Brasil. Além disso, esse fato somente foi descoberto após o decurso de mais de dez anos da instituição de tais 'trusts' e quase sete anos depois da abertura das respectivas contas nas quais transitaram as propinas."

Para a Lava Jato, "a sofisticação desta atividade de ocultação e dissimulação chegou a um nível extremo". A "intenção [de Cunha] de manter ocultos tais valores foi evidenciada por diversas vezes durante seu interrogatório, até mesmo de forma debochada, como quando respondeu sobre as razões de ter mentido à Comissão Parlamentar de Inquérito da Petrobras sobre manter contas no exterior."

 

 

O CASO

O documento do MPF afirma que a Petrobras teve prejuízo de US$ 77 milhões com "atos de corrupção" na compra do campo de petróleo de Benin. "Por outro lado, as propinas totais acertadas neste contrato chegaram a USD 10 milhões de dólares americanos."

Ao longo das 112 páginas, os procuradores afirmam que pareceres técnicos da própria Petrobras que não recomendavam a compra dos campos na África não foram considerados pela diretoria Internacional, que resolveu prosseguir com o negócio. Dizem, ainda, que o à época diretor Jorge Zelada omitiu informações à diretoria executiva que poderiam barrar a aquisição.

Para os procuradores, há "diversos indicativos de que todo o projeto de contratação estava previamente arranjado, pouco importando os dados técnicos produzidos ou as normas de governança da companhia. Em verdade, os documentos produzidos pela equipe da Diretoria Internacional serviram apenas ao suporte documental exigido para formalização do contrato."

"Conforme descrito na denúncia e comprovado (...) na presente ação penal, um percentual dos valores dos contratos celebrados pela Diretoria Internacional da Petrobras – entre eles o de aquisição de 50% dos direitos exploratórios do campo de petróleo em Benin – era repassado indevidamente ao grupo político responsável pela nomeação dos cargos mais importantes na referida pasta. No caso, a partir de 2007, o partido responsável era o PMDB", diz o MPF.

"Existem diversas provas de que tanto o PMDB quanto Eduardo Cunha beneficiaram-se direta e indiretamente do esquema de corrupção na Petrobras, sobretudo no âmbito da Diretoria Internacional da companhia", sustenta a acusação.

 

 

OUTRO LADO

Testemunhas arroladas pela defesa de Eduardo Cunha --inclusive o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva-- negaram ou disseram desconhecer que o deputado cassado tenha indicado nomes para a diretoria da Petrobras ou participado do processo de compra dos campos de petróleo em Benin.

A reportagem entrou em contato com o escritório de Marlus Arns de Oliveira, advogado que defende o peemedebista no caso, e aguarda uma posição sobre as acusações do MPF. Tal qual fez a acusação, a defesa de Cunha também apresentará suas alegações finais a Sergio Moro, última etapa antes que o juiz possa proferir sentença no processo.

 

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