Colaboradores - Fabiano de Abreu

Conheça o jovem técnico alemão que evitou o rebaixamento de seu time e hoje é destaque na Europa

4 de Abril de 2017

Após escapar de iminente rebaixamento, Julian Nagelsmann está perto de levar o Hoffenheim à Liga dos Campeões pela primeira vez na história. Veja o que o ex-jogador tem de tão especial.

O que você imagina de si mesmo aos 29 anos? Onde pretende estar? Quer ter o próprio negócio, subir degraus na escala de sua empresa, chefiar uma equipe? Ganhar na loteria, ou quem sabe, herdar uma fortuna?

Ou o que você fazia quando sequer era um trintão? Já havia alcançado grandes objetivos em sua carreira ou ao menos pavimentado o caminho? Ou lutava para encontrar emprego e ainda morava com os pais?

Julian Nagelsmann é a exceção num universo composto em sua maioria por quarentões e cinquentões. Aos 29 anos, ele está perto de levar o Hoffenheim à Liga dos Campeões pela primeira vez na história – uma temporada depois de livrar o clube de um então provável rebaixamento. A idade é só um número qualquer.

Quando a sensação europeia do banco de reservas nasceu, em 23 de julho de 1987, o admirado Arsène Wenger já era treinador. Carlo Ancelotti, adversário desta terça-feira, assinava com o Milan, seu último clube como jogador. Hoje com 57 anos e à frente do virtual campeão Bayern, o italiano terá a missão de acabar com a invencibilidade do Hoffenheim em casa no Campeonato Alemão.

Trata-se de uma das grandes histórias da temporada. Habitante da Quinta Divisão em 2000, o pequeno clube de um vilarejo de 3.300 pessoas (você leu certo) arrancou para a elite em 2008 com o apoio financeiro do bilionário empreendedor Dietmar Hopp, dentro dos limites impostos pela Bundesliga. E não só se manteve por este tempo inteiro, como está em vias de disputar uma competição europeia na próxima temporada – o atual terceiro lugar garantiria a vaga na fase de grupos da Champions.

Na beira do campo o sucesso atende pelo líder da nova geração de treinadores. Nagelsmann acaba de ser eleito o melhor treinador de 2016 pela DFB (Federação Alemã de Futebol). É, claro, o mais jovem a conquistar tal prêmio, assim como é o mais novo a comandar permanentemente um clube na história da Bundesliga.

A partida contra o Darmstadt, em fevereiro, foi a primeira em que a média de um time era maior do que a idade do técnico adversário – Nagelsmann tinha 29 anos e 210 dias, contra 29 anos e 224 dias dos Lírios. No elenco atual do Hoffenheim, três jogadores são mais velhos.

É impossível encontrar nas cinco principais ligas da Europa (Alemanha, Espanha, França, Inglaterra e Itália) alguém tão jovem no comando. Os mais próximos são Manuel Baum (Augsburg) e Alexander Nouri (Werder Bremen), ambos com 37 anos, e Eddie Howe (Bournemouth), com 39 – a partir daí apenas de 40 para cima. No Brasil, o mais jovem no momento na Série A é Jair Ventura, do Botafogo, com 38 anos.

Mas o que faz dele tão especial?

Voltemos a 2008 para entender um pouco da história. Seguidas lesões no joelho forçaram Nagelsmann a encerrar a sua carreira como zagueiro do Augsburg sem sequer ter atuado pelos profissionais. Ele decidiu seguir ligado ao futebol e tornou-se inicialmente analista do Augsburg II, sob a chefia de Thomas Tuchel, atual técnico do Borussia Dortmund. Simultaneamente, formou-se em Ciência do Esporte após dois anos cursando administração.

Os próximos passos o levaram de volta ao Munique 1860, onde atuou na base. Foi auxiliar da equipe sub-17 do clube e, em 2010, assumiu o mesmo cargo no Hoffenheim. Cresceu gradualmente até o profissional, quando recebeu o apelido de “Baby Mourinho” do ex-goleiro Tim Wiese – o português também não se criou como jogador. Neste período, foi também vice-campeão alemão com o time sub-19.

Em 2012, aos 25 anos, Nagelsmann virou o auxiliar mais jovem da história da Bundesliga ao ser chamado para fazer parte do staff do interino Frank Kramer. “Eu achava que ele não estava falando sério. Foi uma experiência extremamente positiva. Eu nunca tinha vivenciado uma crise esportiva como aquela”, recordou. O Hoffenheim escapou do rebaixamento no playoff depois de terminar em 16º.

Nagelsmann já sabia que seria treinador do time principal do Hoffenheim, mas viu a promoção ser antecipada por conta da saída precoce de Huub Stevens. Em fevereiro de 2016, aos 62 anos, o “bombeiro” holandês renunciou ao cargo por problemas cardíacos e abriu caminho para que alguém 34 anos mais jovem pudesse substituí-lo.

O Hoffenheim estava em crise, tendo vencido duas de 20 partidas, mas arrancou com sete vitórias nos últimos 14 jogos para acabar em 15º, no limite, com um ponto a mais que o Eintracht Frankfurt. Agora faz a melhor campanha de sua história. Para ilustrar: na “Era Nagelsmann”, em 40 rodadas, apenas os gigantes Bayern (100) e Borussia Dortmund (80) somaram mais pontos que o Hoffenheim (71). O Bayer Leverkusen aparece em quarto, com 60.

Não custa repetir: Nagelsmann tem apenas 29 anos.

- Ele é um pouco diferente dos outros treinadores, não apenas porque é o mais novo na história da Bundesliga. Julian tem tudo para se tornar um dos melhores de todos os tempos. Os jogadores estão encantados em cada treino realizado com ele e é assim que abordamos nossos jogos. É por isso que estamos numa fase tão boa – descreveu o atacante croata Andrej Kramaric ao site oficial da Bundesliga.

- Acho que é muito jovem para ser um técnico tão bom. Para nós é uma energia positiva, e ele nos ensina, no bom sentido. No futebol não se trata somente de correr e bater na bola, também é preciso usar o cérebro. E ele nos ensina a pensar – completou.

O currículo o ajuda. Graduado em Ciência do Esporte, Nagelsmann é da corrente moderna do futebol e um grande entusiasta da análise através dos dados, como revelou em entrevista ao jornal inglês “The Times”.

- Treinar está se tornando cada vez mais científico - através de todos os dados que você tem acesso hoje em dia e o desenvolvimento da ciência do esporte. Os treinadores precisam cada vez mais de um conhecimento científico. Não é um pré-requisito fundamental, assim como não é um pré-requisito para um técnico ter sido jogador profissional. Mas você não deve cometer o erro de enxergar o futebol como algo tecnocrático.

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